domingo, 14 de dezembro de 2008

O Sofrimento Humano


Desde os primórdios da existência humana que nos encontramos destinados a sofrer. O Homem nasce a chorar. O Homem adoece. O Homem perde entes queridos. E, não obstante, fica velho! Cada dia traduz-se num envelhecimento celular acentuado, na deterioração das funções básicas para a sobrevivência.

O nosso corpo reduz-se a uma esbelta máquina putrescível. E um dia, morremos. Qual a estranheza ao reduzir a insignificante essência humana, aos olhos da natureza, apenas ao principio basilar de que o Homem nasce para morrer? É um facto. E mais. Sem sofrimento não há sucesso, não há tendência para evoluirmos enquanto ser humano. Todo o sofrimento pode promover o Homem ao seu sucesso enquanto entidade única, individual, autónoma e inteligível.


Como refere a célebre frase de Nietzsche, “o que não me mata, torna-me mais forte”, que serve de modelo explicativo para toda a concepção de que não existe uma trajectória unidireccional até ao clímax da evolução humana. É necessário, e categórico, experienciar dificuldades, sofrer (seja no plano físico como no plano psicológico) para se atingir as metas próprias de cada um.

O sofrimento encontra-se intrinsecamente circundado na vida do Homem desde a sua concepção. É inconcebível e incoerente conceber, ou simplesmente cogitar, uma trajectória vital desprovida de qualquer sofrimento. Tal conjectura refutaria, indubitavelmente, a ideia do indivíduo cingido num modelo humano existencialista e sim, presumivelmente, inserindo-se num modelo mecanicista, indolente, carecido de emoções – o apogeu alienista.

O ser humano necessita de ascender, no seu ritmo biopsicológico, à sua montanha de evolução individual com o intuito de, ao alcançar o seu cume, se depare com o seu self ideal (ou, numa perspectiva nitzscheana, com o seu super-homem). À similitude de todas as escaladas físicas a montanhas, esta caminhada metafísica e transcendental defronta-se, analogamente, com dificuldades e sofrimentos onde é imprescindível ostentar a idoneidade de os subjugar individualmente, sem compaixões (inimiga da evolução humana) nem ajuda de outrem.
Não será essa toda a deliberação da existência humana? Poderá subsistir toda uma reflexão de que, para alem de viver para falecer, o propósito da essência humana é atingir, num plano absorto, o seu self ideal? Estaria, desta forma, decifrada a jornada do Homem ao longo do seu ciclo vital, baseada numa metamorfose profícua da mente humana.

Seria inaugurada, num primeiro estádio, com o nascimento (o clímax do padecimento, onde cada entidade individual é colocada, desamparadamente, num mundo incógnito, perigoso, resignando-se a permanecer, incondicionalmente, dependente de outros).
Posteriormente, no decurso dos seus estádios desenvolvimentistas, o ser humano adquiriria uma certa porção de emancipação e uma forma de pensar ainda não integralmente própria, mas incutida por padrões sociais (onde se incluem regras sociais, normas e valores, paradigmas religiosos).
Nesta etapa o Homem seria bombardeado com os distintos espécimes de sofrimento (medos, receios, imaturidade emocional, lidar com o seu impetuoso ritmo biológico) impostos, maioritariamente, pela sociedade alienada e manipuladora. Numa fase posterior, o ser humano aduziria a competência de renegar todo o conjunto de valores impostos pelos demais, sendo capaz de ser ele o próprio o Criador, ser autónomo, em busca do seu self ideal.
Em desfecho, no seu último estádio desenvolvimentista, cunhado por velhice, ulteriormente a uma extensa caminhada, o Homem alcança ao cume da montanha. O self ideal é absorvido, encerrando todo um ciclo de um processo de metamorfose metafísica.

Raras são as entidades que completam esta jornada evolutiva, diversas são as que não chegam a começar. Num futuro longínquo, em prol da evolução humana, seria sensato fragmentar todas as barreiras alienistas do espírito humano, negligenciando, o quanto possível, as imposições religiosas e morais que possam, de certa forma, moldar toda a mente do Homem no sentido de se sujeitar a padrões comportamentais previstos pelos demais – figuração da raça humana como uma produção em série de maquinismos computadorizados – alcançando um estado psicológico de satisfação pessoal, experienciando as dificuldades e sofrimentos implícitos para a concretização dessa mesma condição.